quinta-feira, 8 de março de 2012

33- Degraus do Paraíso

    Por alguns minutos, ficamos ali, parados, como estátuas. Era como se tudo a nossa frente estivesse acontecendo em câmera lenta. Não fazíamos ideia de como reagir.
    Perdemos o contato com Ana, Bianca e Alice após o segundo desabamento. Estaria ela viva? Estaria ela morta? E se ela tivesse morrido realmente? O que faríamos? Enquanto eu ainda pensava nisso, Jessica me tirou do meu transe.
-Vivirium Zep Innem! – ela disse
-O que você está fazendo? – perguntei
-Usando um feitiço para detectar sinais vitais num raio de 30 metros
    Jessica fechou os olhos e ficou calada por alguns segundos, se concentrando. Logo, abriu os olhos e um sorriso surgiu em seu rosto.
-Elas estão bem – disse Jessica
    O pessoal todo soltou um suspiro de alívio. Mas ainda não havíamos resgatado elas. Ainda poderiam morrer a qualquer momento. E isso era o que parecia mais provável. Uma hora ou outra elas poderiam morrer, sem aviso. E eu não sabia como teria de agir quando isso acontecesse.

PDV da Ana

    Abri os olhos e tentei enxergar, com dificuldade. Minha garganta doía por causa da poeira, e meu corpo estava coberto por fuligem e sujeira.
    Quando o segundo desabamento ocorreu, puxei Bianca e escondi nós duas embaixo de uma placa de ferro que estava atravessada acima da gente. Por sorte, o máximo que conseguimos foi um arranhão.
-Meu Deus! O que foi aquilo? – disse, Bianca, espantada
-Eu... eu... eu não sei – respondi
-Ana, você está trêmula e gaguejando
    Olhei para minha mão. Eu tremia feito um chihuahua.
-Fica aqui – eu disse para Bianca – Vou olhar Alice
    Me levantei e fui até o lado onde Alice estava. Agora havia muito mais escombros no caminho. Mesmo com dificuldade, consegui chegar. Alice parecia muito pior do que antes. Havia um corte em seu braço agora, um corte sério. Seu braço estava lavado em sangue. Usei um pedaço da minha blusa para estancar o sangramento.
-Pronto – eu disse – Aguenta firme
-Ana, me faça um favor – disse Alice
-Fale
    Com a voz fraca, Alice prosseguiu.
-Me deixe morrer
    Engoli em seco. Aquela não era uma proposta fácil de aceitar.
-Eu não posso realizar esse favor – respondi
-Olhe bem – ela disse – As chances de preservar minhas pernas são mínimas. Sabe como é insuportável ser excluída por ser diferente? As pessoas já me olhavam estranho por ser cadeirante. E se eu ficar sem minhas pernas? Isso seria muito pior. Acho que não aguento. Quero morrer. Não entende? Eu quero morrer.
-Eu não posso – repeti
-Faça isso. Meu último desejo.
    Apesar de tudo, eu não podia garantir nem mesmo que eu e Bianca sobreviveríamos.

Fim do PDV da Ana

    Já havia se passado mais de 40 minutos e nada dos bombeiros chegarem. Quando Nath ligou novamente, descobriu que a viatura a caminho da mansão havia furados dois pneus e ia demorar mais. Era muita coincidência. Era uma armação.
-Nath disse que vão chegar em meia-hora – disse Allanis
-Meia-hora?! – Lucas exclamou – Não dá pra esperar tanto tempo!
-Ah, não... – disse Isa
-O que foi? – Nath perguntou
    O olhar de Isa estava vazio, como se tivesse recebido uma notícia horrível. Mas também dava pra notar um pouco de culpa.
-Eu cheguei atrasada do trabalho – ela disse – Cheguei às 22h30m. Mas eu chego às 21h. Na hora da explosão. Seja quem for que fez isso, queria que eu estivesse lá. Era pra eu estar no lugar da Ana
    Os pontos estavam começando a se ligar. Isso significava que quem atacou Isa semanas atrás tentou matá-la novamente.
-Isabela, quem te atacou naquele dia? – perguntei
-Eu já disse: eu não sei. Não me lembro de nada – ela respondeu
    Algo me dizia que ela estava mentindo. Talvez não por querer. Talvez... ela tenha sido ameaçada. Imaginei que ela tivesse sido atacada de novo. Antes que eu pudesse verificar, Isa já havia ido embora.
    De repente, ouvi Karol dizer:
-Olha! Os bombeiros estão chegando!

PDV da Ana

    Eu e Bianca estávamos sentadas uma ao lado da outra. Não havia muita coisa para se fazer ali. O jeito era esperar pela salvação. Ou pela morte.
-Estou com medo. Medo de morrer – disse Bianca
-Eu sei. Eu sei! – agora eu estava gritando – Acha que não estou com medo também? Eu tenho um filho de 2 anos para criar! E eu não quero deixar meu filho sem uma mãe!
    Bianca se encolheu, sem-graça.
-Me desculpa – eu disse – Estamos todas assustadas.
    Me levantei e fui até onde Alice estava. Como médica, eu sabia que não havia como salvar suas pernas, mesmo que ela fosse resgatada. Mas não era fácil simplesmente deixa-la morrer.
-Eu não vou te deixar morrer – eu disse
-Se tiver um pingo de bondade, faça o que estou te pedindo – ela disse – Viver sem minhas pernas seria como um inferno em Terra. Eu não aguentaria isso. Todos os olhares, julgando.
    Foi quando ouvimos um barulho. Como se mexessem nos escombros. Também ouvi vozes. Era o resgate.
-Ouviu isso? O resgate está chegando, Alice! – eu disse
    Então, uma pulsação me empurrou na direção de onde eu e Bianca estávamos. Era a telecinese de Alice.
-Me desculpa, Ana – ela disse
-Não! – gritei
    Alice usou sua telecinese para arrastar um pedaço de ferro que estava acima dela, antes impedindo que os escombros caíssem. Assim que ela fez isso, todos os escombros acima da barra de ferro desabaram sobre ela, esmagando-a.
-Não! Não! – eu disse, desesperada
    Naquele exato momento, todo o resto dos escombros começou a tremer. Aquilo ia desabar de novo.
    De repente, um buraco pequeno se abriu no meio dos escombros. Então, uma brecha maior se abriu, e Matheus e Lucas entraram ali.
-Rápido! Os bombeiros disseram que isso vai desabar de novo e Jessica não vai segurar os escombros por muito tempo – disse Lucas
    Lucas pegou Bianca no colo e Matheus fez o mesmo comigo. Assim que saímos dos escombros, tudo veio abaixo.
    Eu e Bianca fomos colocadas em macas. Antes de ser levada para a ambulância, segurei o braço de Matheus e disse:
-Alice... ela... ela não s... sobreviv... – gaguejei
-Shh – ele disse – Deixa que eu falo disso com o Derek. Agora você precisa repousar
    Tragédias acontecem o tempo todo. Vemos pessoas passando por momentos difíceis várias vezes, mas nunca acreditamos que isso possa acontecer com a gente. E se chegasse a sua vez? Você estaria preparado? Não teria nada do que se arrependesse? Devemos viver cada dia como se fosse o último. Tente dizer “eu te amo” para as pessoas com quem se importa. Não guarde mágoas. Peça desculpas. Afinal, nunca se sabe quando o seu coração irá parar de bater.

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