terça-feira, 27 de março de 2012

38- Um Pedacinho do Paraíso (Ato II)


*Continuação do capítulo 36, “Um Pedacinho do Paraíso (Ato I)”

    De acordo com a explicação dos guardiões, Susan Learth foi encontrada por sua irmã, Amanda Learth, morta em sua cabana, com o pescoço quebrado. Supostas testemunhas me viram entrar na cabana delas duas na hora do crime. Mas eu não tinha feito nada!
    Os guardiões fizeram algo para me deixar desacordado por um tempo. Quando abri os olhos novamente, estava num lugar escuro, amarrado a uma cadeira.
-Ei, que lugar é esse? – exclamei
    Sem responder nada, um dos guardiões se aproximou e socou meu rosto. Outro veio e fez o mesmo. Um terceiro surgiu e chutou minha perna. Mais um veio e me empurrou com força, fazendo com que eu batesse a cabeça na parede. Com o tempo, a dor se tornou tontura. Eu estava quase apagando de novo, mas fiz um esforço.
-Não resista. Será pior – disse um guardião
-Não é o que eu acho – retruquei
-Então espere só – outro guardião me respondeu
    Eles saíram e eu fiquei sozinha na sala escura. Olhei ao redor e tive uma surpresa: minha katana estava apoiada na parede perto de mim. Tentei empurrar minha cadeira até a parede. E consegui. Rapidamente, cortei minhas cordas com a espada e a escondi atrás da cadeira. Depois, esperei até que os guardiões voltassem.
    Alguns minutos depois, eles voltaram, segurando pedras.
-Se a socos e chutes você resistiu, vamos ver se você resiste a pedradas – disse um deles
    Quando eles se prepararam para lançar as pedras, pulei da cadeira com minha katana. Parti pra cima de um deles e furei seu peito. Um líquido preto e viscoso escorreu do ferimento. Enquanto isso, decapitei outros dois. Sobrou apenas um. Cravei minha espada em sua cabeça. Quando seu capuz caiu, pude ver que sua cabeça era apenas uma caveira. Fiz questão de esfarelá-la com minha espada.
-Pronto. Já fui punido o suficiente? – eu disse, sarcasticamente
    Assim que falei isso, mais 3 guardiões apareceram na porta da sala escura, para checar o que aconteceu com os primeiros encarregados. Não precisei fazer muito esforço: sem precisar dar 10 passos, arranquei a cabeça dos 3 de uma vez.
    Logo após tudo isso, guardei minha katana em sua bolsa e a coloquei ao redor do meu tórax. Daí, fui para o lugar mais longe possível da sala de tortura.
    Depois de correr bastante, parei atrás de uma árvore para repor o fôlego. Mas eu não pude ficar parado por muito tempo: Amanda Learth apareceu.
-Seu desgraçado! Era a última vida dela! – Amanda gritou
-Olha, não fui eu quem fez isso – tentei explicar
-Infeliz. Ei! Matheus Rocha está aqui! – ela berrou
    As pessoas logo começaram a me encarar. Merda. Não fiquei para me explicar, apenas corri. Eu tinha acabado de matar 7 guardiões, isso não ficaria bem no meu currículo.
    Desci um morro e me escondi numa caverna. Dali pude ouvir duas garotas que passaram conversando:
-Você sabia? Há um fugitivo entre nós! – disse uma
-Jura? – a outra perguntou – Sim. Disseram que ele matou vários guardiões e chegou a esgotar o estoque de uma garota
    Ah, que ótimo. Eu tinha virado um fugitivo. Viver como fugitivo seria difícil num ligar sem nenhuma tecnologia para me esconder.
-Matheus, o que faz aqui? – ouvi alguém dizer
    Dei um pulo. Quando me virei, vi Jack Williams atrás de mim.
-O que foi? Vai me entregar? – eu disse, desconfiado
-Na verdade, não. Acredito que você seja inocente – ele disse
-Sério?
-Sério
    Tenho que admitir: fiquei com a pulga atrás da orelha. Eu matei 7 guardiões! Nem eu mesmo acreditava no que eu dizia.
    Jack me levou até um lugar distante e me abrigou em uma cabana.
-Obrigado, eu acho – eu disse
    Parei para respirar um pouco. As coisas estavam sendo muito rápidas desde que me acusaram de matar a irmã de Amanda. Eu precisava descansar um pouco.
    Fechei os olhos para me concentrar. Assim que fiz isso, algumas memórias antigas começaram a pipocar em minha mente. Uma amiga minha, enquanto eu estava vivo, disse que ela já enfrentara um ser chamado AL, abreviação para... Amanda Learth. E o pai da minha namorada, era um ditador, anti-mutantes. E ele se chamava Jack Williams.
    Antes que eu pudesse prosseguir, Jack passou uma corda ao redor do meu pescoço. Tentei me soltar, mas não consegui. Tudo se apagou e perdi minha 2ª vida do estoque.
    Quando acordei novamente, continuava na mesma cabana. Jack não estava mais lá.
    Comecei a ligar os pontos: Jack poderia estar querendo continuar sua vingança após a morte. Queria me incriminar pela morte da irmã de Amanda. Ou então... Ou então eles poderiam estar trabalhando juntos. Meus alvos: Jack e Amanda.
    Voltei ao vilarejo onde Amanda morava. Fui me esgueirando em meio às árvores para que os outros moradores não me vissem. Cheguei na cabana de Amanda  e a levei para a floresta comigo.
-Me larga! Me larga! – ela gritou
-Cala a boca, vadia – eu disse – Pensa que eu sou idiota? Amanda Learth. AL. Estou me lembrando. Agora sei. Você não presta. Jack Williams estava junto com você, certo? Tentaram me incriminar. Mas por que você? Nós nem mesmo nos conhecemos em vida
    Por um instante, ela se calou. Mas foi por pouco tempo. Logo, ela começou a gritar, pedindo por ajuda.
-Mandei ficar calada! – esbravejei
    Coloquei minha katana em seu pescoço e puxei. O sangue começou a escorrer e seus corpo e cabeça sem vida caíram no chão.
    Antes que os outros moradores do vilarejo pudessem dar falta de Amanda, saí dali. Porém, quando cheguei do lado oposto da floresta, 4 guardiões me pegaram.
-Alguma chance de me considerarem inocente? – brinquei
-Já chega. Você será levado para a suprema – disse um deles
    Ele pegou uma foice e a bateu 3 vezes no chão, abrindo uma espécie de portal. Então, fomos levados até algo como um salão escuro. Mary esperava, sentada em um tipo de trono.
-Você desrespeitou as regras. Ao extremo – ela disse
-Jack Williams tentou me matar! E matou Susan Learth! – argumentei
-Não. Isso foi tudo um plano. Ele fez o que os outros guardiões não conseguiram. Te puniu
    Naquele exato momento, lembrei de algo: nas histórias que ouvia dos meus amigos, nunca mencionaram o fato de Amanda Learth ter uma irmã. Como eu nunca enfrentei ela, eu supus que ela tinha uma irmã, o que significava...
-Nada disso é real, não é? – eu disse
-Como? – Mary se fez de boba
-Agora eu me lembro. Fui atacado. Minha espada atravessou meu abdômen. Mas eu não morri. Isso tudo é coisa da minha cabeça. Essa é a minha mente. Aqui quem manda sou eu
    Com um piscar de olhos, os guardiões sumiram. Fechei o punho e raízes saíram do chão para prender Mary.
-Não! – ela gritou
-Bum! Você já era – eu disse
    Todo o lugar começou a ruir, e aí... tudo sumiu. Quando abri os olhos, vi que eu estava deitado numa cama de hospital.
-É. Eu estou de volta – eu disse
    27 anos. Vocalista e baterista da banda PsyckoManiacs. Namorado de Jessica Williams, uma feiticeira. 1 filho que ainda não nasceu. 7 amigos: Nathalia Silva, Lucas Costa, Ana Carolina, Allanis Rodrigues, Bianca Tavares, Isabela Lisboa e Karoline Santos. Eu sou Matheus Rocha e essa é minha vida. Agora estou de volta, e não irei embora tão cedo.

domingo, 25 de março de 2012

37- Trégua

PDV da Jessica

    Após a batalha com Leandro, Matheus sofreu um ferimento grave quando seu abdômen foi perfurado por sua espada. A batalha também acabou mal para Jenny, filha de Lucas, que sofreu vários danos após o ataque de Leandro.
    Levamos ambos para o hospital, já que Leandro sumiu após a batalha.
    Algumas horas depois e estávamos todos na sala de espera, ansiosos por uma resposta.
-Você acha que ele está bem? – perguntei a Isa
-Me desculpa, mas espero que não – ela respondeu seriamente – Por causa daquele amigo idiota dele, eu quase morri
-E não foi só ela, Jessica – Ana completou
    Todos assentiram. Fiquei bastante espantada coma reação deles.
-Sinto muito, Jessica – disse Bianca – Mas foi Matheus que colocou Leandro entre a gente
-Ele não sabia – argumentei
-Será? – disse Karol – Eles são amigos de infância. Tenho quase certeza de que isso foi uma armadilha
-Você não foi a única enganada, Jessica – Allanis completou
    Antes que eu pudesse dizer algo em defesa de Matheus, o médico que estava tanto no caso de Jenny quanto no do próprio Matheus, apareceu para dar notícias.
-Srta. Williams, seu namorado perdeu muito sangue – disse o médico – 50% do sangue dele se foi. Além disso, seus rins e apêndice já eram, ele vai precisar de um transplante. Também há o problema da espada: muitas das bactérias presentes na espada causaram infecções. Sinceramente, não podemos garantir que ele sobreviva
-E a minha filha, doutor? – Lucas perguntou
-Ela... Bom, ela precisará de transplantes de pulmão e rim. Seus outros órgãos estão muito fracos, mas não devem chegar a falhar. Mas ela acabou entrando em coma
-Coma? – disse Lucas, arrasado
    Fechei os olhos e tentei me concentrar, por mais difícil que fosse. Matheus não podia morrer. Eu não queria criar um filho sozinha. E eu estava começando a ficar com dor de cabeça por causa das dúvidas do pessoal em relação a Matheus.
    Antes que eu pudesse pensar em alguma coisa, meu celular tocou. A surpresa (surpresa mesmo!) veio quando atendi: era Amy.
-Me encontre na Av. Park, nº 117. É um galpão abandonado. Preciso de sua ajuda. É algo de vida ou morte – ela disse, num tom de voz que indicava desespero
-Como? O que você quer? – perguntei
    Mas não houve resposta, ela já havia encerrado a ligação.
    Aquilo estava estranho. Pelo que Matheus disse, ela não queria me ver nem pintada de ouro. Então, por que ela havia pedido ajuda justo pra mim?
-Nath, vou dar uma volta. Depois eu estarei aqui – eu disse
-Quer que eu vá junto? – ela perguntou
-Não. Não precisa – respondi
    Peguei meu carro no estacionamento do hospital e dirigi até o endereço que Amy me deu. O galpão era mesmo abandonado. Parecia ter sido uma fábrica no passado. Haviam plataformas, containers e vários outros elementos característicos.
-Amy! Onde você está? – gritei
    Eu a ouvi gritar de volta, de uma plataforma. Subi na plataforma e a vi deitada no chão, enfraquecida. Mais uma vítima de Leandro.
-Ele... Ele me atacou. E aí... me deixou aqui... Eu... Eu... – ela gaguejou, desesperada
-Espera, você dormiu com Leandro? – eu disse, indignada – Quando foi isso?
-Hã... Logo após Matheus terminar comigo
-Piranha! Levanta logo daí – tentei controlar minha fúria
    Minha vontade era de arrancar a cabeça de Amy, mas eu não podia fazer aquilo. Não naquela hora. Eu ainda não sabia se Leandro ainda estava no galpão, então o certo seria sair dali o mais rápido possível.
-Piranha? Quem usou o golpe da barriga não fui eu! – Amy retrucou
-Escuta só, sua... Olha, eu te odeio e quero muito puxar cada um dos seus fios de cabelo até você ficar careca, mas seu eu e você continuarmos aqui, podemos morrer. Então, nada de brigas. Não agora
    Ela assentiu e seguimos nosso caminho. Quando descemos a plataforma, Amy parou e se ajoelhou.
-Me desculpa, mas não vou conseguir – ela disse
-O que? Não! Não! – gritei
    Corri até ela e a segurei em meus braços, mas já era tarde. Ela já havia morrido.
-Não! Maldita! Não era pra você ter morrido! – gritei
    Eu a odiava. Mais que tudo. Mas não queria que ela morresse. E naquele momento, ela já era. Decepcionada, dei meia-volta, a caminho do hospital. Porém, quando me virei, senti uma mão fria segurando minha perna. Era Amy. Ela estava no estado “zumbi”, como já tinha visto com minha amiga da Academia de Feiticeiras.
    Chutei sua mão e me afastei. Ela se levantou e caminhou em minha direção para me atacar.
-Zipp Ténium Ecxx! – recitei um feitiço
    Uma onda de energia emanou de minhas mãos e partiu na direção do pescoço da Amy “zumbi”, arrancando sua cabeça.
-Pronto, agora fiz o que eu queria fazer a muito tempo – eu disse
    Aquilo estava estranho. Quando Matheus me contou do caso de Isa, ele disse que quando Jenny a curou, disse algo como “ela já estava morta”. Isso significava que a morte vinha antes do estado fora de controle. Talvez depois de sugar a energia das mulheres, ele desse um jeito de deixá-las “mortas-vivas” para serem como suas escravas.
    Isso também significava que Jenny trouxe Isa de volta à vida. Jenny tinha o dom de ressuscitar pessoas!
    Eu precisava contar tudo isso ao pessoal. Quando fui abrir a porta do galpão, ela não abriu. Estava emperrada. Mas havia algo de errado, pois quando cheguei, a porta não teve problemas.
-Olha só quem está aqui – ouvi alguém dizer
    Me virei e vi Leandro. Lancei um feitiço de raio nele, mas ele absorveu.
-Resistir não é uma boa ideia – ele disse
-A melhor que tenho – retruquei
    Peguei meu livro de feitiços e criei um feitiço para abrir um buraco na parede. Saí pelo buraco e fui parar num beco sem saída.
-Ah, não. Qual foi! – exclamei
    Voltei para dentro do galpão e procurei por outras saídas. Haviam alguns escritórios, então me escondi num deles. Deitei atrás de uma mesa e esperei até ser seguro.
    Depois de 1 hora e meia, nada de Leandro. Achei que já fosse seguro sair. Mas me enganei. Assim que passei pela porta, dei de cara com Leandro me esperando.
-Bu! – ele disse, sarcasticamente
    Então, ele segurou meus pulsos e apertou. Por alguns segundos – que parecerem uma eternidade – senti uma dor horrível. Quando ele terminou, uma pequena estrela negra surgiu em meu braço.
-Não. Leandro, por favor, não! – gritei
    Mas ele já havia sumido. E eu estava sentenciada a morte. Eu e o filho que estava a se formar em meu útero.

Fim do PDV da Jessica

quarta-feira, 21 de março de 2012

36- Um Pedacinho do Paraíso (Ato I)

    Certos dias você acorda simplesmente se sentindo mal. Como quando você acorda depois de uma daquelas noites de bebedeira e se sente como se um trator tivesse te atropelado. Você tem o pressentimento que não deveria levantar da cama. Pois é, eu tive um dia assim. Mas não foi uma bebedeira. Aliás, o que foi mesmo?
-Matheus! Matheus! – disse uma voz feminina
    Abri os olhos, com dificuldade. Pude ver o céu claro e uma mulher de uns 30, aproximadamente.
-Demorou a acordar!  Vejo que é um dos mais dorminhocos de nós – ela disse
-Nós? Nós quem? E onde estou? – perguntei
    Me levantei e olhei em volta. Estava num enorme campo aberto, sem nenhum sinal de civilização. Dava pra ver várias pessoas caminhando pelo campo.
-Prazer, sou Mary. E essa é a dimensão dos mortos – ela disse – Uma vez que seu coração para de bater, você vem parar aqui. Não há tecnologia, não há armas, apenas há paz
-Só uma pergunta – eu disse
-Sim?
-Quem é esse Matheus? Sou eu? Eu não... eu não sei quem eu sou
***
    Matheus Rocha. 27 anos. Vocalista e baterista da banda PsyckoManiacs. Namorado de Jessica Williams, uma feiticeira. 1 filho que ainda não nasceu. 6 amigos: Nathalia Silva, Lucas Costa, Ana Carolina, Allanis Rodrigues, Bianca Tavares, Isabela Lisboa e Karoline Santos. Essa foi a vida que deixei pra trás.  Vida que não terei mais.
***
-Uau! – eu disse, ainda confuso com a explicação de Mary
-E vá se acostumando. Você não irá para outra dimensão, essa é eterna – disse Mary – Faça amizades. Você não pode ficar solitário pela eternidade. Mas um aviso: aqui não há espaço para todos os mortos do mundo. Então, cada um possui um “estoque”, digamos assim, de vidas. 3 vidas. Uma vez que você perde essas 3, não há mais chance.
    E então, Mary sumiu. Ela esperava que eu ficasse animado com essa última parte?
    Fiquei inseguro. Eu não conhecia ninguém e nem sabia como começar. O que eu ia dizer? E se não gostassem de mim? Resolvi ver a resposta e me aproximei de um grupo de 5 homens que estavam conversando.
-O... olá. Tudo bem... com vocês? – gaguejei, inseguro
    Os 5 homens olharam para mim rapidamente e voltaram a conversar.
-Hã... Oi – tentei puxar assunto – Sou novato aqui e...
-Um calouro! Olha só! – disse um deles
-É – eu disse, ainda tímido – Eu estava pensando em fazer amizades, quem sabe...
    Antes que eu pudesse terminar, um deles socou meu abdômen. Outro, me pegou pelo ombro e me jogou no chão, me fazendo rolar na grama. Em seguida, eles me cercaram e começaram a me chutar. Por todos os lados. Apenas me encolhi e desejei que acabasse logo.
    Depois de 5 minutos, eles pararam. Tudo começou a girar e eu apaguei de novo. Não demorou muito para Mary me acordar novamente.
-Não, não, não – ela dizia
-O que foi? – perguntei
-Você precisa tomar cuidado. Apesar de 90% dos mortos conseguirem a eternidade, ainda há 10% que acabam esvaziando seu estoque. E quando isso acontece, você perde sua segunda chance. Desaparece de vez. É por isso que todo mantém a paz. Se você perder mais 2 vidas, tudo acaba. De vez.
    Apenas fiquei quieto enquanto ouvia o sermão de Mary. Ela explicou que não posso ser inocente, pois muitas pessoas de mal caráter também vão para essa dimensão. Também explicou que não há céu ou inferno e por isso não há a divisão “bons/maus”.
-Tome cuidado. Entendeu? – ela explicou
-Vou tentar – respondi
    Mas fazer isso era mais difícil do que parecia. Eu não conseguia perceber quem eram os “Maus-caracteres”.  Talvez eu não conseguisse. Talvez eu não conseguisse a eternidade.
    Logo após o discurso de Mary, parei para descansar embaixo de uma árvore. Eu já não sentia mais a dor por causa da briga. Pelo menos essa dimensão tinha um lado bom.
    Encostei a cabeça na árvore e fechei os olhos, tentando dormir. Sempre dizem que os primeiros dias são os piores. O que não dizem é que em alguns casos, nenhum dia é bom.
    Antes que eu pudesse dormir, alguém me interrompeu.
-Olá
    Dei um pulo, assustado. Um senhor, de uns 50 ou 60 anos, se aproximou.
-Calma. Não precisa ter medo – ele disse
    Mesmo assim, mantive certa distância. Aqueles 5 homens também pareciam ser gente boa, mas eu me enganei. Aparências enganam às vezes.
-Notei que é novo. Diga seu nome – ele disse
-Não sei com certeza – respondi – Acho que não sou muito bom com nomes. Não lembro nem mesmo o meu!
-Bom, o meu é Jack Williams – disse o senhor
-Prazer, Jack. Ah, lembrei! Sou Matheus!
    Nos cumprimentamos com um aperto de mão.
-Poderia me mostrar o lugar e explicar como funcionam as coisas por aqui? – perguntei
-Claro! Venha comigo! – disse Jack
    Subimos um pequeno morro. Do outro lado do morro pude ver várias moradias simples, como cabanas.
-Todos nós moramos naquele tipo de casas. Você irá morar numa delas em breve – ele disse
-Que... legal – eu disse, confuso
    Em meio às pessoas, seres encapuzados e sombrios vagavam pelos cantos. Não pude deixar de notar que aquilo era bem sinistro.
-O que são aquelas coisas? – perguntei
-São os guardiões – Jack respondeu – São eles que mantêm a ordem. Aliás, já puniram seus agressores
    Jack sinalizou para que eu o seguisse. Ele me guiou até uma das cabanas vazias, com uma cama simples e sem nenhum outro adereço.
-Pronto. Você irá morar aqui daqui pra frente – ele disse
-Ok, obrigado
    Me sentei na cama. Tentei visualizar a suposta vida que Mary me contou, mas não consegui. Aquilo estava ficando distante para mim. Os supostos amigos e namorada eram apenas nomes para mim. Nomes que eu já havia esquecido.
    Minutos depois, uma mulher apareceu na porta da minha cabana.
-Oi! Sou sua vizinha, como vai? Soube que você é novo – ela disse
-É, sou sim. Meu nome é Matheus
-Amanda. Amanda Learth
-Prazer, Amanda. É bom já estar fazendo amizades – eu disse, apertando sua mão
-Moro aqui do lado com minha irmã. Qualquer coisa, é só falar com a gente
    Depois disso, fiquei sozinho em minha cabana e resolvi dormir.
***
    No dia seguinte, fui acordado de maneira agressiva. Três guardiões entraram em minha cabana e me imobilizaram.
-Ei, ei, o que houve? – eu disse, confuso
-Você será punido pela morte de Susan Learth, irmã de Amanda Learth

ENCERRAMENTO DO ATO I

quinta-feira, 15 de março de 2012

35- Fim de Jogo

    Estávamos todos – menos Ana – reunidos no funeral de Alice. Alguns familiares e amigos compareceram. Derek e o pai de Alice eram os mais arrasados, choravam a cada palavra dita pelo pastor, que fazia um discurso sobre a batalhadora que Alice tinha sido enquanto viva.
    Assim que a cerimônia acabou, olhei para Isa e ela fez um sinal afirmativo. Então, prossegui:
-Pessoal, antes de irmos, vamos passar no hospital para ver Ana. Quero todo mundo reunido – eu disse
-Por quê? – Karol perguntou
-Na hora vocês todos vão saber – respondi
    Fomos até o hospital onde Ana estava. Bianca havia sido liberada para ir ao enterro de Alice, mas Ana não quis ir. Assim que chagamos, fomos direto ao seu quarto.
-Todo mundo aqui? Que estranho... – ela disse
-É porque temos algo muito importante a dizer – Nath respondeu
-Muito importante mesmo – Lucas enfatizou
-Tá, e o que é? Esse suspense tá me matando! – Allanis exclamou
    Respirei com força. Nem eu havia conseguido processar tudo, então precisava ir com calma.
-Quem está por trás dos assassinatos das amigas de Jessica, e quase matou Isa, Ana e Bianca... é Leandro – eu disse
***
    Eufóricos, todos começaram a falar ao mesmo tempo. Estavam confusos. E eu entendia, pois eu era um dos que estavam mais confusos.
-Como assim? Esse tempo todo estávamos próximos a um assassino? – disse Bianca, confusa
-Eu quase morri por causa daquele desgraçado? – disse Ana
-O que a gente faz? – Karol perguntou
    Parei para analisar a pergunta de Karol. Leandro ainda achava que éramos seus amigos, mas não sabia de que nós já tínhamos descoberto a verdade. Tínhamos o elemento-surpresa.
-Vamos atacar. Essa noite – respondi

PDV do Lucas

    Estava combinado, Naquela noite, iríamos atacar Leandro. Matheus fingiria uma conversa sobre futebol ou qualquer coisa. Quando Leandro estivesse despreparado, nós atacaríamos e o mataríamos de uma vez.
    Fui para casa, descansar antes da batalha. Julie estava em seu escritório, desenhando alguns vestidos – e Jenny a ajudava colorindo os rascunhos.
-Como vão minhas garotas favoritas? – eu disse, beijando Julie em seguida
-Ótimas – Julie respondeu – Jenny coloriu muito bem os meus desenhos. Acho que ela será uma ótima designer, assim como a mãe
    Jenny estava sorrindo enquanto pintava, mas seu sorriso sumiu de repente e ela largou os desenhos. Seus olhos estavam amarelos. Ah, não, ela leu minha mente.
-Quero participar da luta também – disse Jenny
-Lutar? Do que ela está falando? – Julie perguntou
    Expliquei tudo a Julie. Assim que terminei de explicar, nossa resposta para Jenny foi a mesma: “não”.
-Por quê? – Jenny insistiu
-Porque você só tem 5 anos – respondi – Ainda é uma criança. E essa batalha será perigosa
-Vou fazer 6 em 2 meses e já controlo meus poderes, além de descoberto novos. Eu sou poderosa. Ontem mesmo curei tia Isa.
-A resposta é não – Julie decretou
    Mas Jenny não havia terminado a conversa.
-Eu vou insistir até vocês deixarem – ela disse
-Você é a nossa única filha – eu disse – Não sei o que faríamos se algo acontecesse a você
-Não vai acontecer. Lembra de que sou a mutante mais poderosa de todos? Ainda lembro dessa história.
    Uma coisa não dava pra negar: Jenny puxou minha teimosia. Depois dela muito insistir e argumentar, acabamos permitindo que ela participasse da batalha. Mas algo me dizia que isso foi um erro.

Fim do PDV do Lucas

    Chegou a noite. Leandro foi até minha casa pra assistirmos um jogo de futebol. No meio do jogo, desliguei a TV e resolvi ir direto ao ponto.
-Nós já sabemos, Leandro – eu disse
-Sabem de quê? – ele disse, se fazendo de confuso
    Puxei a almofada do sofá e saquei minha katana. Eu a coloquei no pescoço de Leandro, imobilizando-o. Porém, ele lançou um raio em meu peito, me empurrando em direção à parede.
-Você é tão idiota – ele disse – Por que você acha que eu pegava tantas garotas? Eu sugava a energia delas, para me dar força. Já peguei umas mutantes também, ou seja, suguei os poderes delas. Sou invencível
-Ok, nem tanto – disse Nath
    Nath, Allanis e Lucas surgiram, atacando Leandro com tudo que podiam: lâminas, pedras e choques elétricos. Com os ataques, Leandro foi lançado ao quintal, Jessica usou um feitiço para prendê-lo ao chão, enquanto Marcelo o socava.
    Leandro se soltou e empurrou Marcelo. Lucas foi atacá-lo, mas foi golpeado e caiu na grama.
-Pai! – Jenny gritou
    Os olhos dela ficaram vermelhos. Eu sabia o que isso significava.
    De repente, seus braços se tornaram eletricidade; seu tórax se tornou ar; suas pernas se tornaram água; seu rosto se tornou pedra; e seu cabelo se tornou fogo.
-Você machucou meu pai! – disse Jenny, com uma assustadora voz deformada
    Uma cúpula elétrica foi se formando nas palmas de suas mãos e crescendo cada vez mais.
    Lucas se levantou e correu até sua filha. Ele passou os braços ao redor do tórax dela e tentou segurá-la.
-Jennifer, acalme-se! – disse Lucas
    Um pulso elétrico afastou Lucas de Jenny. Enquanto isso, a cúpula elétrica criada por ela foi crescendo cada vez mais, até ficar do tamanho de uma casa inteira. Então, Jenny lançou a enorme cúpula elétrica na direção de Leandro. Mas aí veio a surpresa: Leandro havia absorvido o poder da cúpula.
    Logo, Leandro recriou as duas cúpulas de energia, agora maiores, e... as lançou na direção de Jenny. Ela foi lançada com tudo contra a parede da minha casa e desmaiou.
-Jennifer! – Lucas gritou
    Lucas ia atacar Leandro, mas eu o impedi.
-Vá ver como Jenny está, eu cuido de Leandro – eu disse
    Ele assentiu. Saquei minha katana novamente e fui até Leandro.
-Qual é, Matheus! – disse Leandro – Somos amigos. Vamos ser parceiros!
-Não, obrigado. Já tenho os parceiros de quem preciso – retruquei
    Pulei nos ombros de Leandro e cravei minha katana no topo de sua cabeça. O sangue começou a jorrar e ele desabou no chão.
-Vencemos. Vencemos! – gritei
    Corri até o pessoal e demos um abraço em grupo. Começamos a comemorar, nossos problemas tinham acabado.
    Mas aí, aconteceu. Foi tudo muito rápido. Quando me virei, vi Leandro se levantando lentamente. Ele retirou a katana do alto de sua cabeça e a lançou em nossa direção. Jessica estava na mira.
-Jessica, cuidado! – exclamei
    Empurrei Jessica para o lado, e aí... a espada atravessou meu abdômen. O sangue começou a escorrer. Minha visão ficou embaçada e eu fiquei tonto.
-Matheus! Não! – Jessica exclamou, desesperada
    Caí no chão. Comecei a me sentir fraco.
-Calma, você vai ficar bem – ela disse – Chamem uma ambulância!
    Antes que eu pudesse dizer algo, minha visão escureceu. E então, acabou. Tudo se acabou.

34- Depois da Tempestade...

PDV da Ana

    Minha cabeça latejava. Meu ouvido zunia. Eu estava péssima. Nunca tinha me sentido tão mal em toda a minha vida.
    Abri os olhos. Eu estava num quarto de hospital, cheia de aparelhos. Renato e Rafael estavam sentados ao meu lado, esperando eu acordar.
-Mamãe, você acordou! – disse Rafael, me abraçando
-Mas é claro! Acha mesmo que sua mãe é tão dorminhoca assim? – brinquei
    Pra falar a verdade, eu estava hiper cansada e cheia de sono, mas eu precisava vê-los. Queria ter certeza de que estava viva. Ainda parecia inacreditável eu ter sobrevivido ao acidente.
    Estava tudo parecendo um sonho, mas se tornou um pesadelo. A porta do quarto se abriu e Derek entrou no quarto, furioso.
-Foi culpa sua! – ele apontou para mim
-Exatamente o quê foi culpa minha? – eu disse
-Foi culpa sua Alice ter morrido – ele responder
    De novo não. Eu tinha esquecido disso, e agora estava sendo forçada a sentir culpa mais uma vez.

Fim do PDV da Ana

PDV da Bianca

    Um cheiro forte penetrou meu nariz. Cheiro de lugar limpo. Abri os olhos e vi que estava num quarto de hospital, com o braço engessado e vários curativos. Não havia ninguém no quarto. Ninguém. Eu quase morri e ninguém tinha ido me ver? Que ótimo.
    Segundos depois, a porta se abriu e Dean entrou no quarto.
-Me desculpa, Bianca – ele disse – Eu estava viajando a trabalho, aí o Matheus disse o que aconteceu e...
-Como é? – exclamei – Você soube do acidente e nem se deu o trabalho de ver como eu estava? E se eu tivesse morrido?
    Dean se calou. Dava pra ver que ele não tinha resposta. E talvez o melhor fosse ele ficar calado mesmo. Eu não estava com paciência para ouvir nada.
    Ele se aproximou, tentando me abraçar, mas eu não deixei.
-Não me toque – eu disse, num tom repreendedor
-Mas... – ele tentou argumentar
-Some daqui. Não quero ver a sua cara. Não tão cedo
    Mesmo relutante, ele fez o que eu mandei.

Fim do PDV da Bianca

    Girei a chave e liguei o carro. Chovia tanto que aquela água toda seria capaz de encher uma represa.
    Isa estava desaparecida. Ela havia sumido do mapa depois do que ela disse durante o incidente na mansão. Aquilo que ela disse havia me intrigado. Seria possível o caso das garotas mortas e o ataque à mansão estarem ligados?
    Pedi que Jessica usasse um feitiço que pudesse rastrear Isa, e o resultado indicava que ela estava na fronteira do estado. Eu e Nath estávamos indo até lá.
    Eram apenas 16h da tarde, mas o céu estava completamente escuro por causa da chuva. A pista estava escorregadia e deserta. Jessica ia nos guiando por telefone, até que chegamos numa casa bem bonita, do tipo usado pelas famílias felizes dos filmes.
    Mas a casa era bem diferente por dentro. Não haviam móveis, fotografias ou bens pessoais. A casa estava abandonada.
-Isabela! – gritei – Pode aparecer! Sou eu, Matheus!
    Ouvimos passos vindos da escada. Isa apareceu para nós, com uma aparência fragilizada. A julgar pela pele e cabelo envelhecidos, ela estava se transformando de novo. Eu estava certo. Isso tudo tinha a ver com ela.

PDV da Ana

    Pedi que Renato e Rafael saíssem do quarto para que eu pudesse falar com Derek e tentasse acalmá-lo, o que não foi muito fácil.
-Não foi minha culpa Alice ter morrido – eu disse
-Foi sim! Você é médica, poderia operá-la e retirá-la dos escombros – ele retrucou
-Derek, ela queria morrer – respondi – E mesmo assim, o lugar estava sujo demais. Se eu fizesse uma cirurgia ali, ela poderia pegar uma infecção e morrer do mesmo jeito
-Eu perdi tudo que eu tinha. E a culpa é sua
    Chega de luto. Meu sangue já estava fervendo e eu queria acabar com aquela discussão o mais rápido possível.
-Acha que já não me sinto culpada o suficiente? – devolvi – Alice se suicidou. Suicídio. Não havia nada que eu pudesse fazer, mas mesmo assim me sinto uma assassina! Não me sai da cabeça o fato de que eu poderia ter salvado Alice. Mas eu não consegui. É, eu não consegui. Nem sempre podemos ter o que queremos. E eu não preciso de você me acusando porque já basta a culpa que estou sentindo
    Derek não respondeu nada. Apenas me encarou por alguns segundos e foi embora. Alguns tempo depois, Allanis entrou no quarto.
-Você vai poder ir no enterro de Alice? – ela perguntou
-Não. Não quero continuar sentindo culpa por algo que não fiz – respondi

Fim do PDV da Ana

PDV da Bianca

    Alguns minutos após minha briga com Dean, Karol entrou no quarto.
-Eu soube da briga – ela disse – Dê uma chance a ele
-Não. De jeito nenhum – respondi – Aposto que se eu morresse, ele não ia ligar
    Dean entrou no quarto novamente. Karol saiu e nos deixou a sós. Eu já devia ter imaginado que aquele era algum dos planos dela.
-Acho que eu não ia me importar se você morresse? – disse Dean – Se você morresse, a vida perderia o sentido. Eu não apareci durante o acidente porque tinha medo. Medo do pior ter acontecido. Sei que parece que não te amo, mas eu te amo mais do que tudo. Você está viva e é isso que importa
-Será que você pode parar de ser perfeito? – brinquei
    Ele deu um riso e se aproximou para me beijar. Na verdade, eu não tinha nada do que reclamar. Eu tinha o melhor namorado do mundo.

Fim do PDV da Bianca

    Eu e Nath levamos Isa até Jenny, filha de Lucas, para ser curada novamente. Em seguida, eu, Nath e Lucas conversamos com Isa, nos fundos da casa de Lucas, tentando descobrir quem estava por trás de tudo isso.
-Isa, diz quem foi que te atacou – disse Lucas
-Faça um esforço – disse Nath
-Eu... eu ainda não lembro – Isa respondeu
    De repente, os olhos de Isa passaram de castanhos a amarelos. Jenny apareceu na porta da casa, com os olhos amarelos também.
-Ela sabe. Consigo ver o que ela está pensando – disse Jenny
-Isa, conte. Por favor. É importante – eu disse
-Tá legal, eu conto – disse Isa, se rendendo
    Nós ficamos surpresos com o que Isa disse. Podíamos esperar qualquer coisa, menos aquilo: o assassino estava entre nós.

quinta-feira, 8 de março de 2012

33- Degraus do Paraíso

    Por alguns minutos, ficamos ali, parados, como estátuas. Era como se tudo a nossa frente estivesse acontecendo em câmera lenta. Não fazíamos ideia de como reagir.
    Perdemos o contato com Ana, Bianca e Alice após o segundo desabamento. Estaria ela viva? Estaria ela morta? E se ela tivesse morrido realmente? O que faríamos? Enquanto eu ainda pensava nisso, Jessica me tirou do meu transe.
-Vivirium Zep Innem! – ela disse
-O que você está fazendo? – perguntei
-Usando um feitiço para detectar sinais vitais num raio de 30 metros
    Jessica fechou os olhos e ficou calada por alguns segundos, se concentrando. Logo, abriu os olhos e um sorriso surgiu em seu rosto.
-Elas estão bem – disse Jessica
    O pessoal todo soltou um suspiro de alívio. Mas ainda não havíamos resgatado elas. Ainda poderiam morrer a qualquer momento. E isso era o que parecia mais provável. Uma hora ou outra elas poderiam morrer, sem aviso. E eu não sabia como teria de agir quando isso acontecesse.

PDV da Ana

    Abri os olhos e tentei enxergar, com dificuldade. Minha garganta doía por causa da poeira, e meu corpo estava coberto por fuligem e sujeira.
    Quando o segundo desabamento ocorreu, puxei Bianca e escondi nós duas embaixo de uma placa de ferro que estava atravessada acima da gente. Por sorte, o máximo que conseguimos foi um arranhão.
-Meu Deus! O que foi aquilo? – disse, Bianca, espantada
-Eu... eu... eu não sei – respondi
-Ana, você está trêmula e gaguejando
    Olhei para minha mão. Eu tremia feito um chihuahua.
-Fica aqui – eu disse para Bianca – Vou olhar Alice
    Me levantei e fui até o lado onde Alice estava. Agora havia muito mais escombros no caminho. Mesmo com dificuldade, consegui chegar. Alice parecia muito pior do que antes. Havia um corte em seu braço agora, um corte sério. Seu braço estava lavado em sangue. Usei um pedaço da minha blusa para estancar o sangramento.
-Pronto – eu disse – Aguenta firme
-Ana, me faça um favor – disse Alice
-Fale
    Com a voz fraca, Alice prosseguiu.
-Me deixe morrer
    Engoli em seco. Aquela não era uma proposta fácil de aceitar.
-Eu não posso realizar esse favor – respondi
-Olhe bem – ela disse – As chances de preservar minhas pernas são mínimas. Sabe como é insuportável ser excluída por ser diferente? As pessoas já me olhavam estranho por ser cadeirante. E se eu ficar sem minhas pernas? Isso seria muito pior. Acho que não aguento. Quero morrer. Não entende? Eu quero morrer.
-Eu não posso – repeti
-Faça isso. Meu último desejo.
    Apesar de tudo, eu não podia garantir nem mesmo que eu e Bianca sobreviveríamos.

Fim do PDV da Ana

    Já havia se passado mais de 40 minutos e nada dos bombeiros chegarem. Quando Nath ligou novamente, descobriu que a viatura a caminho da mansão havia furados dois pneus e ia demorar mais. Era muita coincidência. Era uma armação.
-Nath disse que vão chegar em meia-hora – disse Allanis
-Meia-hora?! – Lucas exclamou – Não dá pra esperar tanto tempo!
-Ah, não... – disse Isa
-O que foi? – Nath perguntou
    O olhar de Isa estava vazio, como se tivesse recebido uma notícia horrível. Mas também dava pra notar um pouco de culpa.
-Eu cheguei atrasada do trabalho – ela disse – Cheguei às 22h30m. Mas eu chego às 21h. Na hora da explosão. Seja quem for que fez isso, queria que eu estivesse lá. Era pra eu estar no lugar da Ana
    Os pontos estavam começando a se ligar. Isso significava que quem atacou Isa semanas atrás tentou matá-la novamente.
-Isabela, quem te atacou naquele dia? – perguntei
-Eu já disse: eu não sei. Não me lembro de nada – ela respondeu
    Algo me dizia que ela estava mentindo. Talvez não por querer. Talvez... ela tenha sido ameaçada. Imaginei que ela tivesse sido atacada de novo. Antes que eu pudesse verificar, Isa já havia ido embora.
    De repente, ouvi Karol dizer:
-Olha! Os bombeiros estão chegando!

PDV da Ana

    Eu e Bianca estávamos sentadas uma ao lado da outra. Não havia muita coisa para se fazer ali. O jeito era esperar pela salvação. Ou pela morte.
-Estou com medo. Medo de morrer – disse Bianca
-Eu sei. Eu sei! – agora eu estava gritando – Acha que não estou com medo também? Eu tenho um filho de 2 anos para criar! E eu não quero deixar meu filho sem uma mãe!
    Bianca se encolheu, sem-graça.
-Me desculpa – eu disse – Estamos todas assustadas.
    Me levantei e fui até onde Alice estava. Como médica, eu sabia que não havia como salvar suas pernas, mesmo que ela fosse resgatada. Mas não era fácil simplesmente deixa-la morrer.
-Eu não vou te deixar morrer – eu disse
-Se tiver um pingo de bondade, faça o que estou te pedindo – ela disse – Viver sem minhas pernas seria como um inferno em Terra. Eu não aguentaria isso. Todos os olhares, julgando.
    Foi quando ouvimos um barulho. Como se mexessem nos escombros. Também ouvi vozes. Era o resgate.
-Ouviu isso? O resgate está chegando, Alice! – eu disse
    Então, uma pulsação me empurrou na direção de onde eu e Bianca estávamos. Era a telecinese de Alice.
-Me desculpa, Ana – ela disse
-Não! – gritei
    Alice usou sua telecinese para arrastar um pedaço de ferro que estava acima dela, antes impedindo que os escombros caíssem. Assim que ela fez isso, todos os escombros acima da barra de ferro desabaram sobre ela, esmagando-a.
-Não! Não! – eu disse, desesperada
    Naquele exato momento, todo o resto dos escombros começou a tremer. Aquilo ia desabar de novo.
    De repente, um buraco pequeno se abriu no meio dos escombros. Então, uma brecha maior se abriu, e Matheus e Lucas entraram ali.
-Rápido! Os bombeiros disseram que isso vai desabar de novo e Jessica não vai segurar os escombros por muito tempo – disse Lucas
    Lucas pegou Bianca no colo e Matheus fez o mesmo comigo. Assim que saímos dos escombros, tudo veio abaixo.
    Eu e Bianca fomos colocadas em macas. Antes de ser levada para a ambulância, segurei o braço de Matheus e disse:
-Alice... ela... ela não s... sobreviv... – gaguejei
-Shh – ele disse – Deixa que eu falo disso com o Derek. Agora você precisa repousar
    Tragédias acontecem o tempo todo. Vemos pessoas passando por momentos difíceis várias vezes, mas nunca acreditamos que isso possa acontecer com a gente. E se chegasse a sua vez? Você estaria preparado? Não teria nada do que se arrependesse? Devemos viver cada dia como se fosse o último. Tente dizer “eu te amo” para as pessoas com quem se importa. Não guarde mágoas. Peça desculpas. Afinal, nunca se sabe quando o seu coração irá parar de bater.

terça-feira, 6 de março de 2012

32- Estrada para o Inferno

    Fogo. E destroços. Por toda a parte. Para qualquer lugar que você olhasse, veria rastros de tragédia e destruição.
-Me fala a verdade – disse Renato, se aproximando – Acha que elas vão sobreviver?
-Bom, os bombeiros já estão chegando... – eu disse
-Não foi isso que eu te perguntei – ele rebateu
    Olhei para os restos da mansão. A situação estava complicada. Havia uma parte intacta, mas isso era ainda pior, porque outro desabamento podia acontecer. Tudo indicava que a resposta para a pergunta de Renato era “não”.
-Olha, - dei uma pausa – se eu fosse você, me prepararia para um funeral. Se tivermos sorte, teremos apenas um
    Renato suspirou. Seu olhar estava vazio.
-Pra falar a verdade... Estou perdendo as esperanças – ele disse

2 horas atrás
PDV da Ana

    Eu havia acabado de chegar do trabalho. Eram 21h, Rafael já estava dormindo. Passei em seu quarto para lhe dar um beijo na testa.
    Como Renato estava trabalhando com sua banda, achei uma boa ideia passar na mansão para falar com o pessoal. Ainda íamos à mansão, era o nosso ponto de encontros. Lá, encontrei Alice, Karol, Bianca e Nath, que estavam na sala assistindo TV.
-Cadê o resto do pessoal? – perguntei
-Lucas está na casa dele, Matheus está num show com os PsyckoManiacs – disse Karol
-Isa ainda não chegou do trabalho, nem Allanis – Nath completou
-Estamos assistindo Glee, não tem nada de bom passando mesmo – disse Alice
    Me sentei no sofá junto a eles. Alguns minutos depois, Marcelo apareceu na mansão e Nath foi para sua casa junto ao marido. Leonardo apareceu logo depois para buscar Karol.
-E aqui estamos nós, as esquecidas – Bianca brincou
-Estou entediada... – eu disse – Que tal fuxicar o quarto do Matheus?
-Ótima ideia! – disse Alice
    Mesmo assim, não achamos nada interessante. Parecia que estávamos predestinadas a ficar entediadas naquele dia. Ou não.
-Estou ouvindo um barulho estranho, vem lá debaixo – disse Alice
-Barulho? Eu não ouvi nada – eu disse
-Calma aí. Vou lá embaixo ver o que é
-Quer ajuda com a cadeira de rodas? – perguntei
-Eu me viro, esqueceu? – ela deu um risinho
    Enquanto isso, eu e Bianca continuamos a revirar o quarto de Matheus. De repente, ouvimos Alice gritar do 1º andar:
-Ai, meu Deus! – ela gritou – Ana, Bianca, a gente tem que sair daqui !
-O quê? O que houve? – Bianca gritou de volta
    Não deu tempo para Alice responder de volta. Eu e Bianca ouvimos um estrondo. O chão se rachou e partiu rapidamente. O fogo consumiu o lugar em segundos. Num piscar de olhos, nós duas fomos parar no 1º andar, em meio a destroços.
    Bianca estava caída ao meu lado. Seu braço sangrava e ela aparentava estar desacordada.
-Você tá legal? – perguntei
    Ela tentou se levantar, mas sentiu uma dor súbita em seu braço.
-Não. Acho que quebrei o braço – ela respondeu
-Se a gente não sair logo daqui, vamos quebrar mais do que o braço – eu disse

Fim do PDV da Ana

    Eu e os PsyckoManiacs estávamos num show no centro da cidade. Assim que o show acabou e peguei meu celular, vi que havia 10 ligações perdidas de Allanis e mais 16 de Jessica. Só podia ser algo extremamente importante para elas me ligarem tantas vezes.
    Falei para os caras da banda que eu tinha algo urgente e dirigi até a mansão. Levei um susto enorme ao chegar, pois a mansão não estava mais lá. O que eu via era apenas um monte de lixo e destroços.
-Meu Deus! – exclamei
-Isso não é tudo – disse Allanis – Ana, Bianca e Alice estão lá dentro
-Como isso aconteceu? – perguntei
-Uma bomba – Lucas respondeu – Eu vi e ouvi da minha casa quando aconteceu
    Quer dizer que uma bomba foi plantada na mansão? Como? Por quê? Isso eu ainda não sabia, mas o que eu sabia era que Ana, Bianca e Alice não estavam bem.

PDV da Ana

    Me lembrei de Alice. Ela estava lá embaixo na hora que aconteceu. Ela deveria estar bem pior do que eu e Bianca.
-Alice! Alice, está me ouvindo?! – gritei
-Aqui! – eu a ouvi gritar, vindo da direita
    Fui até o lugar de onde ouvi os gritos, me esquivando das chamas e dos destroços. Meu coração veio à boca quando vi o que estava à minha frente: Alice estava caída no chão, com uma pilha de destroços cobrindo suas pernas.
-Eu vi a bomba. Estava tentando avisar. Mas não deu tempo. E agora estou presa – ela disse apressadamente
-Shh... Fica calma – eu disse
    Meu celular começou a tocar. O identificador mostrava que era Matheus.
-Graças a Deus! Você está bem! – ele exclamou
-Eu estou. Bianca e Alice nem tanto – eu disse – Chamem os bombeiros. Precisamos que cheguem o mais rápido possível
-Já chamamos. Logo vocês estarão fora daí
-É bom mesmo – respondi
    A fumaça estava começando a penetrar o lugar. Não havia saída. Estava tudo bloqueando pelos destroços. Ficava difícil respirar. Era bom os bombeiros chegarem logo.

Fim do PDV da Ana

Agora, no presente...

    Assim que Isa chegou, liguei novamente para Ana e coloquei no viva-voz para que todos falassem com ela.
-Usei um pedaço da minha calça para imobilizar o braço quebrado de Bianca – Ana disse
-Aguentem aí – Isa disse – Os bombeiros já estão chegando
-Alice é quem está pior – ela disse – Preciso que os bombeiros sejam rá... Espera. Ouvi um barulho
-Barulho? Que barulho? – eu disse
-Ah, não. Ah, não! Ah, não! – Ana exclamou, desesperada – Isso aqui vai desabar de novo!
    Quando olhamos para a mansão novamente, pudemos ver a pilastra que estava sustentando a parte intacta da mansão estava se partindo. E aí, tudo desabou e vez.
-Não! Não! – Renato exclamou
-Ana, você tá aí? Ana! – gritei ao celular
    Mas nenhuma resposta veio. Isso não era bom.
-Perdemos o sinal – eu disse

CONTINUA...